Actualmente, os vinhos portugueses são como as gravatas.

Caríssimos,

Tem sido crescente, prova após prova, novidade após novidade, descoberta após descoberta, pensar e perguntar cada vez mais: Quando se deve parar de forçar a identidade?

Actualmente, os vinhos portugueses são como as gravatas.

Felizmente, vamos entrar em 2018 e não em 1988. Sem lá ter estado, há 30 anos atrás, parece-me que agora estamos em pleno boom qualitativo dos vinhos portugueses. Haveriam seguramente produtores que há 3 décadas trabalhavam da forma correcta, mas seriam também, quase garantidamente, uma pequena percentagem quando comparados com as mãos que temos hoje a trabalhar os vinhos portugueses. O negócio em 30 anos mudou e fez mudar quem faz.

Certamente, sempre foram produzidos grandes vinhos, mas agora é que é, agora é que temos oferta, muita e excelente oferta. Prova deste salto qualitativo são os vinhos brancos aos quais actualmente temos acesso, vinhos que hoje se pensam e se trabalham como ninguém o fazia há um par de décadas atrás.

Como as gravatas, que hoje se usam com bolas, bolinhas, riscas, xadrez, cornucópias, lisas, etc, também os vinhos não deixam, hoje, nenhuma região de parte, há qualidade em todas, tudo se usa, tudo se bebe, nenhuma está fora de jogo. E isto não obstante, de há 15 anos atrás, existirem ainda regiões proibidas, que também trabalhavam mal e que também demoraram a acordar.

Portugal, neste momento, tem muitos padrões de gravatas, e usam-se todas, sem medos.

Do que se lê, Portugal está entre os países mais ricos em termos de quantidade de diferentes castas existentes em território nacional. A acrescentar a isto, está o terroir, que molda a casta e não o oposto. Como dizia Hamilton Reis (Cortes de Cima): “pensem em terrior e castas como um envelope e uma mensagem, as castas são o envelope, mas o terroir é a mensagem, as castas apenas transportam aquilo que diz o terroir de determinada região”.

De todas as regiões vinícolas portuguesas, algumas afirmam-se como típicas, genuínas, peculiares, de onde sai um produto diferente e incapaz de ser tentado em outro qualquer terroir. No limite, todas seriam assim, mas para mim não… É verdade que vemos os vinhos durienses, ou alentejanos, ou da Península de Setúbal, ou de Lisboa, como os mais consensuais, como os mais facilmente aceites pelo grande consumidor. Estes são as gravatas lisas, ou às riscas.

Mas depois há a tipicidade, a especificidade, a exclusividade. Estes vinhos são as gravatas de xadrez bonito, ou com cornucópias encantadoras.

Onde estão as gravatas mais ousadas?

No fim da busca, ficamos com o Dão, a Bairrada, o Minho. Regiões onde há a tipicidade, o factor diferenciador, o factor irreplicável.

De entre estas regiões, o Minho é poderosíssimo, com claro factor diferenciador. O Dão voltou a ter de se reinventar, mas na verdade nunca perdeu o factor distintivo. No entanto, para mim, a Bairrada merece reflexão… Esta tem o factor irreplicável. Já provei bons Alvarinhos no Alentejo, nunca provei um bom Baga do Alentejo.

Mas algo está a mudar na Bairrada, há uma fronteira que parece estar a ser ultrapassada e é aqui que a pergunta “Quando se deve parar de forçar a identidade?“, começa a fazer mais sentido.

Quando perceber se a gravata passa de ousada, a excêntrica, insensata ou até bizarra?

Ter tipicidade deveria ser sinónimo de fazer bem usando as diferenças que se tem, realçando-as, elevando-as. Ser típico não é só fazer diferente, correndo o risco de colar a esta diferença erros do passado, levando a uma não aceitação de quem até estaria aberto a experimentar.

Vejo em alguns vinhos da Bairrada erros do passado, vejo este tipo de fronteira a ser transposta, existe agora uma tentativa de leveza que obviamente não é criticável, mas existe também uma tentativa cada vez maior de forçar a diferença e essa insistência, pode afastar a diferença da excelência.

O “factor X” deve acrescer à qualidade, deve ser a cereja no topo do bolo. Se procurarmos só algo que seja diferente, de diferença em diferença, podemos no final até nem encontrar o “factor X”, e, ficar apenas com gravatas com padrões bizarros, tipo Rato Mickey, ou elefantes, ou ursos, ou palhaços… E isso já não é definitivamente bonito.


Saúde,
Dr. Ribeiro

foto: www.zazzle.pt/gravata_garrafas_artisticas_e_vidros_dos_amantes_de_vinho-151924736816104658

 

 

 

Prova

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